quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

NATAL DE NOSSO SENHOR – Silenciar para que o Verbo nascido seja pronunciado em nós



NATAL DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO
SOLENIDADE COM OITAVA
25 DE DEZEMBRO

«Silenciar para que o Verbo nascido seja pronunciado em nós»

"«Quando tudo estava envolvido em profundo silêncio, o teu Verbo todo-poderoso desceu.» (Sb 18,14-15) É deste Verbo que se trata hoje... Qual é então o lugar em que Deus vem pronunciar a sua Palavra e gerar o seu Filho? O coração em que tal nascimento deve cumprir-se há de guardar uma grande pureza, viver uma intensa vida interior, um profunda união com Deus. Se não se dispersar com o exterior mas permanecer recolhido, unido a Deus no mais profundo do seu ser, aí Deus escolhe habitar.

Como cooperar para este nascimento, para esta inspiração misteriosa do Verbo? Como
merecer que ele se realize em nós? Temos que nos aplicar a isso através de imagens ou de pensamentos acerca de Deus? Podemos apressar este novo nascimento de Deus em nós? Ou será melhor, pelo contrário, esvaziarmo-nos de qualquer pensamento, de qualquer palavra, de qualquer ação e de qualquer imagem e postarmo-nos diante de Deus no silêncio total para O deixarmos agir em nós?... A própria Palavra respondeu: "Foi no meio do silêncio que uma palavra secreta me foi dirigida." (Jb 4,16)

Recolhe-te pois, se o podes fazer; esquece tudo na tua oração; liberta-te das imagens de que estás cheio. Quanto mais esqueceres o resto, mais és capaz de receber esta Palavra que é para ti tão misteriosa... Evita pois a atividade e os pensamentos que te agitam, porque eles impedem a paz interior. Para que Deus fale o seu Verbo em nós, é preciso que nós mesmos estejamos na paz e no silêncio. Assim, Ele pode fazer-nos ouvir a sua Palavra - Ele próprio se fala em nós.

No Natal festejamos um triplo nascimento. O primeiro e mais sublime nascimento é o do Filho único gerado pelo Pai celeste na essência divina, sendo nisso distinto das pessoas. O segundo nascimento é o que se deu numa mãe que na fecundidade guardou a pureza absoluta da sua castidade virginal. O terceiro é aquele pelo qual Deus, todos os dias, à mesma hora, nasce em verdade, espiritualmente, pela graça e pelo amor, numa alma boa.

Para que seja possível este terceiro nascimento, permitamo-nos apenas a procura simples e pura de Deus, e abdiquemos de qualquer outro desejo que não nos seja próprio, tendo apenas como única vontade a de Lhe pertencermos, de Lhe darmos lugar da maneira mais digna e elevada, em total intimidade com Ele, para que possa realizar a sua obra, para que possa nascer em nós sem o menor obstáculo. Por isso nos diz Santo Agostinho : «Esvazia-te para que possas ficar completo; sai para que possas entrar», e diz ainda noutro texto: «Ó tu, alma nobre, nobre criatura, porque procuras fora de ti o que está em ti próprio, tão inteiro, da maneira mais verdadeira e manifesta? E, pois que participas da natureza divina, porque te hás-de importar com as coisas criadas, que tens tu a ver com elas?» Se o homem preparasse assim um lugar no mais profundo do seu ser, Deus, sem dúvida, seria obrigado a ocupá-lo e completamente; o próprio céu romper-se-ia para o fazer. Deus não pode deixar as coisas vazias; tal seria contrário à sua natureza, à sua justiça.

É por isso que deves calar-te; o Verbo deste nascimento poderá então ser pronunciado em ti e poderás ouvi-lo. Mas fica certo de que, se quiseres falar, Ele calar-se-á. A melhor maneira de servirmos o Verbo é calarmo-nos e escutarmo-Lo. Portanto, se saíres por completo de ti próprio, Deus entrará completo em ti; o quanto de ti próprio tu saíres, será o quanto Ele em ti entrará, nem mais, nem menos.


Johannes Tauler, O.P. (Juan Tauler)
Místico Dominicano do século XIV
Sermão para a celebração do Natal


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