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domingo, 14 de março de 2010

Chiara Lubich – Jesus convida-nos a ter o mesmo amor sem limites do Pai



Chiara Lubich
Fundadora dos Focolares

14 de março de 2008
14 de março de 2009


Jesus convida-nos a ter o mesmo amor sem limites do Pai

«Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado» (Lc 15,32)

Esta frase se encontra no final da chamada parábola do filho pródigo - que certamente você conhece - e quer revelar-nos a grandeza da misericórdia de Deus. Ela conclui todo um capítulo do Evangelho de Lucas, no qual Jesus narra outras duas parábolas para ilustrar o mesmo assunto.

Lembra-se do episódio da ovelha desgarrada, em que o dono do rebanho procura aquela que se perdera, deixando as outras noventa e nove no deserto?

Lembra-se também da história da dracma perdida e da alegria da mulher que, após encontrá-la, chama as amigas e as vizinhas para se alegrarem com ela?

«Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado»

Estas palavras são um convite que Deus dirige a você, e a todos os cristãos, para rejubilar-se com ele, para festejar e participar da sua alegria pela volta do homem pecador que antes estava perdido e depois foi encontrado. E, na parábola, são estas as palavras dirigidas pelo pai ao filho mais velho que havia compartilhado toda a sua vida mas que, após um dia de trabalho duro, se recusa a entrar em casa, onde se festeja a volta de seu irmão.

O pai vai ao encontro do filho fiel - assim como foi ao encontro do filho perdido - e procura convencê-lo. Mas é evidente o contraste entre os sentimentos do pai e os sentimentos do filho mais velho: de um lado o pai, com seu amor sem limites e com sua grande alegria, da qual gostaria que todos participassem; do outro lado o filho, cheio de desprezo e de ciúmes de seu irmão, que ele não reconhece mais como irmão. Com efeito, falando dele, diz: "Este teu filho, que devorou teus bens".

O amor e a alegria do pai pelo filho que voltou evidenciam ainda mais o rancor do outro, rancor que indica um relacionamento frio - diríamos até falso - com o próprio pai. A este filho importa o trabalho, o cumprimento do seu dever; mas ele não ama o pai como um verdadeiro filho. Ao contrário, mais parece que lhe obedece como a um patrão.

«Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado»

Com estas palavras Jesus denuncia um perigo em que também você pode incorrer: viver apenas para ser uma "pessoa de bem", baseando sua vida na busca da perfeição e criticando os irmãos "menos perfeitos" que você. Na verdade, se você estiver "apegado" à perfeição, construirá o seu ego, ficará cheio de si mesmo, cheio de admiração pela própria pessoa. Será como o filho que permaneceu em casa, e que enumera ao pai os seus méritos: "Há tantos anos que eu te sirvo e jamais transgredi um só dos teus mandamentos".

«Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado»

Com estas palavras, Jesus censura aquela atitude segundo a qual a relação com Deus estaria fundamentada apenas na observância dos mandamentos, porque essa observância não é suficiente. Disso também a tradição judaica está bem consciente.

Nesta parábola Jesus põe em evidência o Amor divino, mostrando como Deus, que é Amor, dá o primeiro passo em direção ao homem sem levar em consideração se ele merece ou não; Deus quer que o homem se abra a ele para poder estabelecer uma autêntica comunhão de vida. Naturalmente, como você pode entender, o maior obstáculo diante de Deus-Amor é justamente a vida daqueles que acumulam ações, obras, enquanto Deus quer simplesmente o seu coração.

"Mas era preciso festejar e alegrar-se porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado"

Com estas palavras, Jesus convida você a ter, diante do homem pecador, o mesmo amor sem limites que o Pai tem para com ele. Jesus o convida a não julgar segundo a sua própria medida o amor que o Pai tem para com qualquer pessoa. Convidando o filho mais velho a compartilhar a sua alegria pelo filho encontrado, o Pai pede também a você uma mudança de mentalidade: na prática, você deve acolher como irmãos e irmãs também aqueles homens e mulheres pelos quais nutriria apenas sentimentos de desprezo e de superioridade. Isto provocará em você uma verdadeira conversão, porque o purifica da sua convicção de ser "mais perfeito", evita que você caia na intolerância religiosa e o faz acolher como puro dom do amor de Deus a salvação que Jesus lhe proporcionou.


Chiara Lubich
Palavra de vida, Março de 2001
Focolares

Chiara Lubich – Deus deseja a misericórdia e não o sacrifício



Chiara Lubich
Fundadora dos Focolares

14 de março de 2008
14 de março de 2010


«Ide, pois, aprender o que significa: 'Desejo a misericórdia e não o sacrifício'.» (Mt 9,13)

A atitude de Jesus era tão nova diante da mentalidade comum que, muitas vezes, por assim dizer, escandalizava as pessoas de bem. Como aconteceu quando ele convidou Mateus a segui-lo e depois foi almoçar com ele. Mateus era um cobrador de impostos. Por causa do seu ofício, o povo não só não gostava dele mas o considerava um pecador público, um inimigo a serviço do Império Romano.

Por que - questionam os fariseus - Jesus come com um pecador? Não é melhor manter distância de certas pessoas? Essa pergunta torna-se para Jesus uma ocasião de explicar que ele quer ir ao encontro justamente dos pecadores, assim como um médico vai ao encontro dos doentes; e ele conclui dizendo aos fariseus que procurem estudar o significado da palavra de Deus pronunciada no Antigo Testamento pelo profeta Oséias: "Desejo a misericórdia e não o sacrifício".

Por que Deus quer de nós a misericórdia? Porque deseja que sejamos como ele. Devemos assemelhar-nos a ele assim como os filhos se assemelham ao pai e à mãe. Ao longo de todo o Evangelho, Jesus nos fala do amor do Pai para com os bons e os maus, para com os justos e os pecadores. Deus ama cada um, não faz distinções e não exclui ninguém. Se ele tem alguma preferência, é por aqueles que, aparentemente, menos merecem ser amados, como é o caso do filho pródigo da parábola. "Sede misericordiosos - explica Jesus - como vosso Pai é misericordioso": esta é a perfeição.

«Ide, pois, aprender o que significa: 'Desejo a misericórdia e não o sacrifício'.»

Também hoje Jesus dirige a cada um de nós o convite: "Ide, pois, aprender…" Mas, ir para onde? Quem poderá nos ensinar o que significa ser misericordioso? Uma única pessoa: só ele, Jesus, que foi à procura da ovelha perdida, que perdoou aos que o tinham traído e crucificado, que deu sua vida pela nossa salvação. Para aprendermos a ser misericordiosos como o Pai, perfeitos como ele, precisamos olhar para Jesus, que é a plena revelação do amor do Pai. Ele disse: "Quem me viu, viu o Pai".

«Ide, pois, aprender o que significa: 'Desejo a misericórdia e não o sacrifício'.»

Por que a misericórdia e não o sacrifício? Porque o amor é o valor absoluto que dá sentido a todo o resto, também ao culto, também ao sacrifício. Com efeito, o sacrifício mais agradável a Deus é o amor concreto para com o próximo, que encontra a sua expressão mais alta na misericórdia.

Misericórdia que ajuda a ver sempre novas as pessoas com as quais vivemos a cada dia, na família, na escola, no trabalho, sem nos lembrarmos mais dos seus defeitos, dos seus erros; que não nos leva a julgar mas a perdoar as injustiças sofridas. Mais ainda: a esquecê-las.

O nosso sacrifício não consistirá tanto em fazer longas vigílias e jejuns, dormir no chão, mas em acolher sempre no nosso coração qualquer um que passe ao nosso lado, seja ele bom ou mau.

Foi isso que fez um senhor que trabalhava no setor de recepção e caixa de um hospital. O seu povoado tinha sido inteiramente incendiado pelos seus "inimigos". Um belo dia viu chegar um homem com um parente doente. Pelo seu sotaque descobriu logo que se tratava de um dos "inimigos". Ele estava assustado; não queria revelar a sua identidade para não ser mandado embora. O caixa não lhe pediu os documentos e lhe ajudou, apesar de ter que se esforçar para superar o ódio que há tempo remoía dentro dele. Nos dias seguintes teve a possibilidade de dar-lhe assistência em diversas ocasiões. No último dia de internação o "inimigo" foi pagar a conta e disse ao caixa: "Preciso lhe confessar uma coisa que você não sabe". E ele: "Desde o primeiro dia sei quem é você". "E por que você me ajudou, se eu sou um 'inimigo' seu?"

Assim como aconteceu com ele, também para nós a misericórdia nasce do amor que sabe sacrificar-se por quem quer que seja, conforme o exemplo de Jesus, que chegou ao ponto de dar a vida por todos.


Chiara Lubich
Palavra de vida, Junho de 2002
Focolares

Chiara Lubich – Sede bondosos e compassivos uns para com os outros



Chiara Lubich
Fundadora dos Focolares

14 de março de 2008
14 de março de 2010


«Sede bondosos e compassivos, uns para com os outros, perdoando-vos mutuamente, como Deus vos perdoou em Cristo» (Ef 4,32)

É um programa de vida concreto e essencial. Só ele já bastaria para criar uma sociedade diferente, mais fraterna, mais solidária. Ele faz parte de um amplo projeto que o Apóstolo propõe aos cristãos da Ásia Menor. Naquela comunidade foi alcançada a paz entre judeus e gentios, os dois povos até então divididos que representavam a humanidade. A unidade, doada por Cristo, deve ser sempre reavivada e traduzida em comportamentos sociais concretos, inteiramente inspirados pelo amor mútuo. Daí a razão por que Paulo dá estas orientações sobre como devemos nos relacionar:

«Sede bondosos e compassivos, uns para com os outros, perdoando-vos mutuamente, como Deus vos perdoou em Cristo»

“Sede bondosos…”: ser bom, querer o bem do outro. É “fazer-nos um” com ele, aproximar-nos dele estando completamente vazios de nós mesmos, dos nossos interesses, das nossas idéias, dos muitos preconceitos que ofuscam o nosso olhar, para tomar sobre nós os seus pesos, suas necessidades, seus sofrimentos, para compartilhar as suas alegrias.

É entrar no coração daqueles que encontramos para entender a sua mentalidade, sua cultura, suas tradições e, de certo modo, fazê-las nossas; para entender realmente aquilo de que estão precisando e saber colher os valores que Deus derramou no coração de cada pessoa. Numa palavra: viver por quem está ao nosso lado.

“Sede compassivos…”: a compaixão. Acolher o outro tal como ele é; não como gostaríamos que fosse: com um caráter diferente, com as mesmas idéias políticas nossas, com as nossas convicções religiosas e sem os tais defeitos ou modos de fazer que tanto nos incomodam. Não. É preciso dilatar o coração e torná-lo capaz de acolher a todos na sua diversidade, com os seus limites e misérias.

“… perdoando-vos mutuamente": o perdão. Ver o outro sempre novo. Mesmo nas convivências mais agradáveis e serenas, na família, na escola, no trabalho, nunca faltam os momentos de atrito, as divergências, os desencontros. Às vezes se chega a não falar mais um com o outro, ou a evitar-se, isso quando não se estabelece no coração um verdadeiro ódio contra os que têm um ponto de vista diferente. A conquista mais forte e exigente é procurar ver cada dia o irmão e a irmã como se fossem novos, novíssimos, esquecendo-se completamente das ofensas recebidas e cobrindo tudo com o amor, com uma anistia total do nosso coração, imitando desta forma Deus, que perdoa e esquece.

E enfim, alcançamos a paz verdadeira e a unidade quando vivemos a bondade, a compaixão e o perdão não apenas como pessoas isoladamente, mas em conjunto, na reciprocidade.

E assim como acontece numa fogueira, onde as brasas são sufocadas pela cinza se não forem remexidas, da mesma forma as relações com os outros podem ser sufocadas pela cinza da indiferença, da apatia, do egoísmo, se não reavivarmos de tempo em tempo os propósitos de amor mútuo, os relacionamentos com todos.

«Sede bondosos e compassivos, uns para com os outros, perdoando-vos mutuamente, como Deus vos perdoou em Cristo»

Essas atitudes precisam ser traduzidas em fatos, em ações concretas.

O próprio Jesus demonstrou o que é o amor quando curou os doentes, quando saciou a fome das multidões, quando ressuscitou os mortos, quando lavou os pés dos discípulos. Fatos, fatos: isso é amar.

Lembro de uma mãe de família africana: viu a própria filha Rosângela perder um dos olhos, vítima da agressividade de um garoto que a feriu com um pedaço de pau e ainda continuava caçoando dela. Nem o pai nem a mãe do menino tinham pedido desculpas pelo acontecido. O silêncio, a falta de relacionamento com essa família a deixavam angustiada. “Fique tranqüila – dizia Rosângela, que já tinha perdoado –, ainda tive sorte: pelo menos posso ver com o outro olho!”

“Um dia, de manhã – conta a mãe de Rosângela –, a mãe daquele garoto mandou me chamar porque estava passando mal. A minha primeira reação foi: ‘Essa não! Ela tem tantos outros vizinhos, e agora vem pedir ajuda logo a mim, depois de tudo o que seu filho fez conosco!’.

Mas na hora me lembrei de que o amor não tem barreiras. Corri até a sua casa. Ela abriu a porta e desmaiou nos meus braços. Levei-a para o hospital e lá fiquei até que os médicos a atendessem. Depois de uma semana, quando ela teve alta, veio até em casa para me agradecer. Procurei acolhê-la de todo o coração. Consegui perdoá-la. Agora o relacionamento se recompôs. Ou melhor, começou totalmente novo”.

Podemos preencher também o nosso dia com serviços concretos, humildes e inteligentes, expressões do nosso amor. Veremos crescer ao nosso redor a fraternidade e a paz.


Chiara Lubich
Palavra de vida, Agosto 2006
Focolares

Chiara Lubich – Jesus viveu por amor, irradiando amor, doando amor, trazendo a lei do amor



Chiara Lubich
Fundadora dos Focolares

14 de março de 2008
14 de março de 2010


Jesus viveu por amor, irradiando amor, doando amor, trazendo a lei do amor

"Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (Jo 14,6)

Talvez não exista nos Evangelhos uma definição mais elevada e mais completa de Jesus do que esta, a de que Ele, Jesus, dá de si mesmo. É uma síntese da sua missão e da sua identidade. E ela é comunicada a nós, para que possamos encontrar nele o caminho mais seguro, o único que leva ao Pai. Com efeito, o versículo se conclui com as palavras: "Ninguém vai ao Pai senão por mim". Com as suas palavras Jesus nos revela aquilo que Ele é em si mesmo, e o que Ele é para cada homem e mulher desta terra.

«Eu sou o caminho, a verdade e a vida»

De que modo Jesus nos revela que Ele é a verdade? Dando testemunho da verdade com a sua vida e seu ensinamento. "Para isso nasci e para isto vim ao mundo: para dar testemunho da verdade" (Jo 18,37). Nós vivemos de acordo com a verdade, nós somos verdade, na medida em que somos a Palavra de Jesus. Mas, se Jesus é o caminho enquanto é a verdade, também é o caminho enquanto é vida para nós. "Eu vim para que tenham a vida e a tenham em abundância" (Jo 10,10). Quando nos nutrimos dele feito Pão na Eucaristia, bem como quando nos nutrimos de sua Palavra, Cristo cresce em nós.

E para que esta vida que existe em nós não se apague, nós, por nossa vez, devemos comunicá-la do único modo que Jesus nos ensinou: oferecendo-a como um dom aos nossos próximos.

«Eu sou o caminho, a verdade e a vida»

"Preparai o caminho do Senhor" (Lc 3,4), gritava o Batista no deserto de Judá, fazendo eco ao profeta Isaías. E aí está Aquele que se apresenta como o Senhor-Caminho, como Deus feito homem para que tenhamos acesso ao Pai por meio de sua humanidade.
Mas, qual foi o caminho usado por Jesus?

Sendo Filho de Deus, que é Amor, Jesus veio a esta terra por amor, viveu por amor, irradiando amor, doando amor, trazendo a lei do amor, e morreu por amor. Depois, ressuscitou e subiu ao Céu, realizando o seu plano de amor. Pode-se dizer que o caminho percorrido por Jesus tem um só nome: amor. E que nós, para segui-lo, devemos caminhar por esse caminho: o caminho do amor.

Mas, o amor que Jesus viveu e que Ele trouxe é um amor especial, único. Não é filantropia, nem simplesmente solidariedade ou benevolência, nem mesmo apenas amizade ou afeto; nem sequer é somente não-violência. É algo de excepcional, de divino: é o próprio amor que arde em Deus. Jesus nos deu uma chama daquele infinito incêndio, um raio daquele imenso sol: amor divino aceso no nosso coração pelo batismo e pela fé, alimentado pelos outros sacramentos, que é um dom de Deus mas que pede toda a nossa parte, a nossa correspondência.

Devemos fazer frutificar esse amor. De que modo? Amando. Não somos plenamente cristãos sem esta nossa contribuição segura. Amando, seguiremos Jesus-Caminho e seremos, como Ele, caminho até o Pai, para muitos de nossos irmãos e irmãs. E seremos cristãos mais convincentes se vivermos juntos este mandamento do amor que Jesus nos deu.

Embora ainda não exista a plena unidade entre nós, entre todos os seguidores de Jesus, podemos demonstrar o amor recíproco com a vida. Com isto temos a possibilidade de ver realizada uma promessa de Jesus: "Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome - que alguns Padres da Igreja interpretam 'no meu amor' - ali estou eu no meio deles" (Mt 18,20).

Nós, cristãos, podemos gozar desde já deste dom da presença de Jesus, por exemplo entre um católico e um anglicano, entre uma ortodoxa e uma metodista, entre um valdense e um armênio. Jesus no meio dos seus! Desse modo será Ele a dizer ao mundo que ainda não o conhece: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida".

Neste mês, sejamos também mais conscientes de que, acima de tudo, a unidade dos cristãos é uma graça e que, portanto, é preciso pedir esse dom. Contemos com a oração feita em conjunto, porque Jesus disse: "Se dois de vós estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que queiram pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus" (Mt 18,19).


Chiara Lubich
Palavra de vida, Janeiro de 2001
Focolares

Quaresma - Experimentar a Misericórdia Divina



«Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia»

A misericórdia de Cristo

«Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia». Partindo, como sempre, da afirmação de que as bem-aventuranças são o auto-retrato de Cristo, também desta vez nos propomos imediatamente a pergunta: como Jesus viveu a misericórdia? O que a sua vida nos diz sobre esta bem-aventurança?

Na Bíblia, a palavra misericórdia se apresenta com dois significados fundamentais: o primeiro indica a atitude da parte mais forte (na aliança, Deus mesmo) para com a parte mais fraca e se expressa habitualmente no perdão das infidelidades e das culpas; o segundo indica a atitude para com a necessidade do outro e se expressa nas chamadas obras de misericórdia. (Neste segundo sentido, o termo se repete com freqüência no livro de Tobias). Existe, por assim dizer, uma misericórdia do coração e uma misericórdia das mãos.

Na vida de Jesus resplandecem as duas formas. Ele reflete a misericórdia de Deus para com os pecadores, mas se comove também ante todos os sofrimentos e necessidades humanas, intervém para dar de comer à multidão, curar os enfermos, libertar os oprimidos. Dele o evangelista diz: «Tomou sobre si nossas fraquezas e carregou nossas enfermidades» (Mt 8, 17).

Em nossa bem-aventurança, o sentido que prevalece é certamente o primeiro, o do perdão e da remissão dos pecados. Nós o deduzimos pela correspondência entre a bem-aventurança e sua recompensa: «Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia», entende-se que é ante Deus, que perdoará seus pecados. A frase: «Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso», se explica imediatamente com «perdoai e sereis perdoados» (Lc 6, 36-37).

É conhecida a acolhida que Jesus reserva aos pecadores no Evangelho e a oposição que isso lhe causou por parte dos defensores da lei, que o acusavam de ser «um comilão e beberrão, amigo de publicanos e pecadores» (Lc 7, 34). Uma das falas historicamente melhor testemunhadas de Jesus é: «Não vim para chamar os justos, mas os pecadores» (Mc 2, 17). Sentindo-se por Ele acolhidos e não julgados, os pecadores o escutavam com agrado.

Um Deus que se alegra em ter misericórdia

Jesus justifica sua conduta para com os pecadores dizendo que assim atua o Pai celestial. A seus detratores recorda a palavra de Deus nos profetas: «Misericórdia quero, e não sacrifícios» (Mt 9, 13). A misericórdia para com a infidelidade do povo, a hesed, é o traço mais sobressalente do Deus da Aliança e enche a Bíblia de um extremo a outro.

Um salmo o repete em forma de ladainha, explicando com ela todos os eventos da história de Israel: «Porque eterna é sua misericórdia» (Sal 136). Ser misericordiosos se apresenta assim como um aspecto essencial do ser «à imagem e semelhança de Deus». «Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso» (Lc 6, 36) é uma paráfrase do famoso: «Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo» (Lv 19, 2).

Mas o mais surpreendente acerca da misericórdia de Deus, é que Ele experimenta alegria em ter misericórdia. Jesus conclui a parábola da ovelha perdida dizendo: «Haverá mais alegria no céu por um só pecador que se converta que por noventa e nove justos que não tenham necessidade de conversão» (Lc 15, 7). A mulher que encontrou o dracma perdido grita a suas amigas: «Alegrai-vos comigo». Na parábola do filho pródigo, também a alegria transborda e se converte em festa, banquete.

Não se trata de um tema isolado, mas profundamente enraizado na Bíblia. Em Ezequiel, Deus diz: «Eu não me alegro na morte do malvado, mas (me alegro!) em que o malvado se converta de sua conduta e viva» (Ez 33, 11). Miquéias diz que Deus «se alegra em ter misericórdia» (Mi 7, 18), isto é, experimenta gozo ao fazê-lo.

Mas por que - surge a questão - uma ovelha deve contar, na balança, como todas as demais juntas, e importar mais, precisamente porque escapou e criou mais problemas? Eu encontrei uma explicação convincente no poeta Charles Péguy. Aquela ovelha - como o filho menor -, ao extraviar-se, fez o coração de Deus tremer. Deus temeu perdê-la para sempre, ver-se obrigado a condená-la e privar-se dela eternamente. Este medo fez brotar a esperança em Deus, e a esperança, uma vez realizada, provocou a alegria e a festa. «Toda penitência do homem é a coroação de uma esperança de Deus» (Ch. Péguy, Il portico del mistero Della seconda virtù). É uma linguagem figurada, como tudo que falamos de Deus, mas contém uma verdade. Nos homens, a condição que torna a esperança possível é o fato de que não conhecemos o futuro, e por isso o esperamos. Em Deus, que conhece o futuro, a condição é que não quer (e, em certo sentido, não pode) realizar o que deseja sem nossa permissão. A liberdade humana explica a existência da esperança em Deus.

O que dizer então das noventa e nove ovelhas bem comportadas e do filho maior? Não existe nenhuma alegria no céu por eles? Vale a pena viver toda a vida como bons cristãos? Recordemos o que responde o Pai ao filho maior: «Filho, tu sempre estás comigo e tudo o que é meu é teu» (Lc 15, 31). O erro do filho maior está em considerar que ter ficado sempre em casa e ter compartilhado tudo com o Pai não é um privilégio imenso, mas um mérito; ele se comporta como mercenário, mais que como filho (isso deveria ser uma alerta para todos nós, que, por estado de vida, nos encontramos na mesma situação que o filho maior!).

Sobre este ponto, a realidade foi melhor que a própria parábola. Na verdade, o filho mais velho - o Primogênito do Pai, o Verbo -, não ficou na casa paterna; Ele partiu para «uma região distante» para buscar o filho menor, isto é, a humanidade caída; foi Ele quem lhe reconduziu a casa, quem lhe procurou vestes e lhe preparou um banquete para participar, em cada Eucaristia.

Em uma novela sua, Dostoievski descreve uma cena que tem todo o ambiente de uma imagem real. Uma mulher do povo tem em seus braços a sua criança de poucas semanas, quando esta - pela primeira vez, diz ela - lhe sorri. Compungida, ela faz o sinal da cruz e a quem lhe pergunta o por que desse gesto, ela responde: «Assim como uma mãe é feliz quando nota o primeiro sorriso de seu filho, assim se alegra Deus cada vez que um pecador se ajoelha e lhe dirige uma oração com todo o coração» (F. Dostoevskij, L'Idiota).

Nossa misericórdia, causa ou efeito da misericórdia de Deus?

Jesus diz «Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia»; e no Pai Nosso nos faz rezar: «Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido». Diz também: «Se não perdoais os homens, tampouco vosso Pai perdoará vossas ofensas» (Mt 6, 5). Estas frases poderiam levar a pensar que a misericórdia de Deus para conosco é um efeito de nossa misericórdia para com os outros, e que é proporcional a ela.

Se assim fosse, no entanto, estaria completamente invertida a relação entre graça e boas obras, e se destruiria o caráter de pura gratuidade da misericórdia divina solenemente proclamado por Deus ante Moisés: «Realizarei graça a quem quiser fazer graça e terei misericórdia de quem quiser ter misericórdia» (Ex 33, 19).

Devemos, então, ter misericórdia porque recebemos misericórdia, não para receber misericórdia; mas é preciso ter misericórdia, senão a misericórdia de Deus não terá efeito em nós e nos será retirada, como o senhor da parábola a retirou ao servo impiedoso. A graça «previne» sempre e é ela a que cria o dever: «Como o Senhor vos perdoou, perdoai-vos também vós», escreve São Paulo aos Colossenses (Col 3, 13).

Experimentar a misericórdia divina

Se a misericórdia divina está no início de tudo e é ela a que exige e torna possível a misericórdia de uns para com os outros, então o mais importante para nós é ter uma experiência renovada da misericórdia de Deus. Nós estamos nos aproximando da Páscoa e esta é a experiência pascal por excelência.

O escritor Franz Kafka tem uma novela titulada «O Processo». Nela, fala de um homem que um dia, sem que ninguém saiba por que, é declarado em detenção, ainda que continue com sua vida costumeira e seu trabalho de modesto empregado. Começa uma extenuante busca para conhecer os motivos, o tribunal, as imputações, os procedimentos. Mas ninguém sabe dizer-lhe nada; só que existe verdadeiramente um processo contra ele. Até que um dia chegam para levá-lo à execução da sentença. No curso do sucesso se vai conhecendo que haveria, para este homem, três possibilidades: a absolvição autêntica, a absolvição aparente e a prorrogação. A absolvição aparente e a prorrogação, contudo não resolveriam nada; serviriam só para manter o imputado em uma incerteza mortal por toda a vida. Na absolvição autêntica, ao contrário, «as atas processuais devem ser completamente suprimidas, desaparecem totalmente do processo, não só a acusação, mas também o processo e até a sentença se destroem, tudo é destruído». Mas destas absolvições autênticas, tão suspiradas, não se sabe da existência de nenhuma; há só rumores ao respeito, nada mais que «belíssimas lendas». A obra conclui assim como todas as do autor: algo que se entrevê de longe, se persegue com afã como um pesadelo noturno, mas sem possibilidade alguma de alcançá-lo.

Na Páscoa, a liturgia da Igreja nos transmite a incrível notícia de que a absolvição autêntica existe para o homem, não é só uma lenda, algo belíssimo, mas inalcançável. Jesus destruiu «a acusação que havia contra nós; e a suprimiu pregando-a na cruz» (Col 2, 14). Destruiu tudo. «Nenhuma condenação pesa já para os que estão em Cristo Jesus» (Rm 8, 1). Nenhuma condenação! De nenhum tipo! Para os que crêem em Cristo Jesus!

Em Jerusalém havia uma piscina milagrosa e o primeiro que se jogava dentro, quando as águas se agitavam, ficava curado (v. Jo 5, 2 ss). No entanto a realidade, também aqui, é infinitamente maior que o símbolo. Da cruz de Cristo brotou a fonte de água e sangue, e não um só, mas todos os que se ajoelham dentro saem curados.

Depois do batismo, esta piscina milagrosa é o sacramento da Reconciliação, e esta última meditação desejaria servir precisamente como preparação para uma boa confissão pascal. Uma confissão «fora de série», ou seja, diferente das acostumadas, na qual permitamos de verdade ao Paráclito «convencer-nos do pecado». Poderíamos tomar como espelho as bem-aventuranças meditadas na Quaresma, começando agora e repetindo juntos a expressão tão antiga e tão bela:

Kyrie eleison! Senhor, tende piedade de nós!


«Bem-aventurados os puros de coração»: Senhor, reconheço toda a impureza e a hipocrisia que há em meu coração, talvez, a dupla vida que levo ante Vós e ante os outros. Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os mansos»: Senhor, eu vos peço perdão pela impaciência e pela violência oculta que existe dentro de mim, pelos juízos temerários, o sofrimento que provoquei às pessoas a meu redor... Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os que têm fome»: Senhor, perdoai minha indiferença para com os pobres e os famintos, minha contínua busca de comodidade, meu estilo de vida aburguesado... Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os misericordiosos»: Senhor, freqüentemente pedi e recebi rapidamente a vossa misericórdia, sem dar-me conta do preço que ela vos custou! Com freqüência fui o servo perdoado que não sabe perdoar. Kyrie eleison!

Há uma graça especial quando não é só o indivíduo, mas toda a comunidade a que se põe ante Deus nesta atitude penitencial. De uma experiência profunda da misericórdia de Deus se sai renovados e cheios de esperança: «Deus, rico de misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, estando nós mortos por causa de nossos delitos, nos vivificou juntamente com Cristo» (Ef 2, 4-5).

Procuremos identificar, em nossas relações com os outros, aquela que pareça mais necessitada de receber o óleo da misericórdia e da reconciliação, e a invoquemos silenciosamente, com abundância, pela Páscoa. Unamo-nos a nossos irmãos ortodoxos, que na Páscoa não se cansam de cantar:

«É o dia da Ressurreição!
Irradiamos gozo pela festa,
Abracemo-nos todos.
Digamos irmão também a quem nos odeia,
Perdoemos tudo por amor à Ressurreição»


Frei Raniero Cantalamessa
Cantalamessa.org

Quaresma - Manifestemos a bondade do Senhor



Manifestemos a bondade do Senhor

Considera de onde te vem a existência, a respiração, a inteligência, a sabedoria, e, acima de tudo, o conhecimento de Deus, a esperança do reino dos céus e a contemplação da glória que, no tempo presente, é ainda imperfeita com num espelho e em enigma, mas que um dia haverá de ser mais plena e mais pura. Considera de onde te vem a graça de seres filho de Deus, herdeiro com Cristo e, falando com mais ousadia, de teres também sido elevado à condição divina. De onde e de quem vem tudo isso?

Ou ainda, - se quisermos falar de coisas menos importantes e que podemos ver com os nossos olhos – quem te concedeu a felicidade de contemplar a beleza do céu, o curso do sol, a órbita da lua, a multidão dos astros e aquela harmonia e ordem que se manifestam em tudo isso como uma lira afinada?

Quem te deu as chuvas, as lavouras, os alimentos, as artes, a morada, as leis, a sociedade, a vida tranqüila e civilizada, a amizade e a alegria da vida familiar?

De onde te vem poderes dispor dos animais, os domésticos para teu serviço e os outros para teu alimento?
Quem te constituiu senhor e rei de todas as coisas que há na face da terra?

E, porque não é possível enumerar uma a uma todas as coisas, pergunto finalmente: quem deu ao homem tudo aquilo que o torna superior a todos os outros seres vivos?

Porventura não foi Deus? Pois bem, agora, o que Ele te pede em compensação por tudo, e acima de tudo, não é o teu amor para com Ele e para com o próximo? Sendo tanto e tão grande os dons que recebemos ou esperamos dele, não lhe oferecer nem mesmo esta única retribuição que pede que é o amor? E se Ele, embora sendo Deus e Senhor, não se envergonha de ser chamado nosso Pai, poderíamos nós fechar o coração aos nossos irmãos?

De modo algum, meus irmãos e amigos, de modo algum sejamos maus administradores dos bens que nos foram concedidos pela graça divina, a fim de não ouvirmos a repreensão de Pedro: “Envergonhai-vos, vós que vos apoderais do que não é vosso; imitai a justiça de Deus e assim ninguém será pobre”.

Não nos procuremos em acumular e conservar riquezas, enquanto outros padecem necessidade, para não merecermos aquelas duras e ameaçadoras palavras do profeta Amós: Tomai cuidado, vós que andais dizendo: “Quando passará o mês para vendermos; o sábado, para abrirmos nosso celeiros?” (cf. Am 8,5).

Imitemos aquela excelsa e primeira lei de Deus, que faz chover sobre os justos e os pecadores e faz o sol igualmente levantar-se para todos; que oferece aos animais que vivem na terra a extensão dos campos, as fontes, os rios e as florestas; que dá às aves a amplidão dos céus, e os animais aquáticos, a vastidão das águas; que proporciona a todos, liberalmente, os meios necessários para a sua subsistência, sem restrições, sem condições, sem fronteiras; que põe tudo em comum, à disposição de todos eles, com abundância e generosidade, de modo que nada falte a ninguém. Assim procede Deus para com as suas criaturas, a fim de conceder a cada um os bens de que necessita segundo a sua natureza e dignidade, e manifestar a todos a riqueza da sua bondade.


São Gregório de Nazianzo
Oratio 14, De pauperum amoré,
23-24:pp.35,889-890

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Quaresma, um "Banquete cristão"



QUARESMA 2010


«Quaresma, um banquete cristão»


“Até os momentos mais sombrios da Liturgia são cheios de alegria, e a Quarta-feira de Cinzas, início do jejum quaresmal, é um dia de felicidade, um banquete cristão. Não pode ser de outro modo, uma vez que faz parte do grande ciclo Pascal.

O Mistério Pascal é, acima de tudo, o mistério da vida no qual a Igreja, ao celebrar a morte e a ressurreição de Cristo, penetra no Reino de Vida que Ele implantou, de uma vez por todas, por meio de sua vitória definitiva sobre o pecado e a morte. Devemos lembrar-nos do sentido original da Quaresma, ver sacrum, a “fonte sagrada” da Igreja na qual os catecúmenos eram preparados para o batismo, e os penitentes públicos purificados, pela penitência, para a restauração da sua vida sacramental em comunhão com o resto da Igreja. Portanto, a Quaresma, é mais tempo de cura do que de punição”.


Thomas Merton, OCSO
Tempo e Liturgia, p.116
Ed.Vozes, Petrópolis

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

APRESENTAÇÃO DO SENHOR - Simeão veio ao templo e, conduzido pelo Espírito, tomou o menino nos braços



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA


«Simeão veio ao templo e, conduzido pelo Espírito, tomou o menino nos braços. Se procuraste bem Jesus, então também tu virás ao templo»


"Simeão veio ao templo, conduzido pelo Espírito". E tu, se procuraste bem Jesus, por toda a parte, quer dizer, se - como a Esposa do Cântico dos Cânticos (Ct 3,1-3) – o procuraste escondido no teu repouso, quer lendo, quer meditando, se também o procuraste na cidade, interrogando os teus irmãos, falando dele, partilhando acerca dele, se o procuraste nas ruas e nas praças aproveitando as palavras e os exemplos dos outros, se o procuraste junto das sentinelas, isto é, escutando os que atingiram a perfeição, então também tu virás ao templo, “conduzido pelo Espírito”. Certamente que esse é o melhor lugar para o encontro entre o Verbo e a alma: procuramo-lo por toda a parte, encontramo-lo no templo… “Encontrei aquele que a minha alma ama” (Ct 3,4). Procura, pois, por toda a parte, procura em tudo, procura junto de todos, passa e ultrapassa tudo para finalmente entrares na tenda, na morada de Deus, e então encontrá-lo-ás.

“Simeão veio ao templo, conduzido pelo Espírito”. Portanto, quando os seus pais levaram o Menino Jesus, também ele o recebeu nas suas mãos: eis o amor que prova pelo consentimento, que se prende pelo abraço, que saboreia pelo afeto. Oh, irmãos, que aqui se cale a língua. Aqui nada é mais desejável do que o silêncio: são os segredos do Esposo e da Esposa, o estrangeiro não poderia tomar parte neles. “O meu segredo é meu, o meu segredo é meu!” (Is 24,16). Onde está, para ti, o teu segredo, Esposa que foste a única a experimentar qual é a doçura que se saboreia quando, num beijo espiritual, o espírito criado e o Espírito incriado vão ao encontro um do outro e se unem um ao outro, a tal ponto que são dois em um, melhor, diria eu, um só, justificante e justificado, santificado e santificante, divinizante e divinizado?

Pudéssemos nós merecer dizer também o que se segue : "Agarrei-te e não mais te largarei" (Ct 3,4). Isso, S. Simeão mereceu-o, ele que disse : "Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz". Quis que o deixassem partir, liberto dos laços da carne, para apertar mais intimamente com o abraço do seu coração Jesus Cristo nosso Senhor, a quem pertence a glória e a honra pelos séculos sem fim.


S. Aelred de Rievaulx, Monge cisterciense
In Ypapanti Domini, pp. 51-52
(Sermões inéditos)

FESTA DA APRESENTAÇÃO DO SENHOR - Oferecei vosso Filho, ó Virgem Santa, apresentai ao Senhor o bendito fruto de vosso seio



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA


«Oferecei vosso Filho, ó Virgem Santa, apresentai ao Senhor o bendito fruto de vosso seio. Oferecei a Hóstia Santa e Agradável a Deus, pela reconciliação de todos nós»


“Oferecei vosso Filho, ó Virgem Santa, apresentai ao Senhor o bendito fruto de vosso seio. Oferecei a Hóstia Santa e Agradável a Deus, pela reconciliação de todos nós. Certamente aceitará Deus Pai a nova oblação, a preciosíssima vítima de quem Ele próprio disse: ‘Eis o meu dileto Filho em quem pus minhas complacências’.

Também eu, Senhor, voluntariamente vos oferecerei meu sacrifício, já que voluntariamente vos oferecestes, não por necessidade vossa mas para minha salvação. Só duas pobres coisas tenho, ó Senhor: meu corpo e minha alma. Quem me dera vo-los oferecer dignamente, em sacrifício de louvor!

Melhor, muito melhor para mim oferecer-me a Vós do que ser abandonado a mim mesmo. Se ficar só, agita-se minha alma. Mas assim que me ofereço a Vós com plena submissão, exulta em Vós meu espírito. Não quereis, ó Senhor, minha morte; e não vos ofereceria eu, de bom grado, minha vida? É, de fato, minha vida, hóstia que aplaca vossa ira, hóstia que vos agrada, hóstia viva”.


São Bernardo de Claraval
In Purificazione B.V. Mariae, 3, 2-3
Sermoni per le feste della Madonna, Ed. Paoline, Roma, 1970

APRESENTAÇÃO DO SENHOR - A apresentação de Jesus no Templo recorda o reconhecimento que se deve ao Criador por toda a vida humana



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA

«Um ancião homem de Deus, Simeão, toma Jesus nos braços e indica n’Ele a salvação que chegou para Israel e para todos os povos: a Luz das nações»

Hoje, Festa da Candelária, recordamos a apresentação de Jesus no Templo. Maria e José, quarenta dias depois do nascimento de Jesus, foram a Jerusalém para O oferecer ao Senhor, segundo a prescrição da lei mosaica. É um episódio que se enquadra na perspectiva da especial consagração do povo de Israel a Deus. Ele, porém, tem também um significado mais amplo: recorda, com efeito, o reconhecimento que se deve ao Criador por toda a vida humana.

A vida é um grande dom de Deus, que se deve acolher sempre com ação de graças. Se no domingo passado eu me mostrava preocupado pelo vazio de valores, que ameaça a nossa convivência, hoje quereria recordar com vigor um destes valores fundamentais, que absolutamente devem ser recuperados, se não se quiser precipitar no abismo: refiro-me ao valor sagrado da vida, de cada vida humana, desde o seu desabrochar no seio materno até ao seu declínio natural.

Digo-o recordando que hoje na Itália se celebra o Dia pela Vida, ocasião propícia para afirmar com vigor que da vida, própria e dos outros, não se pode dispor à vontade: ela pertence ao Autor da vida. O amor inspira a cultura da vida, e o egoísmo, a cultura da morte. Escolhei a vida — diz o Senhor — para viverdes vós e as gerações futuras! (cf. Dt. 30, 19).

No Templo de Jerusalém, segundo a narração evangélica, um ancião homem de Deus, Simeão, toma Jesus nos braços e indica n’Ele a salvação que chegou para Israel e para todos os povos: a Luz das nações (cf. Lc. 2, 30-31).

As palavras do santo ancião dão voz ao anélito que percorre a história da humanidade. Exprimem a expectativa de Deus, aquele desejo universal, talvez inconsciente mas incancelável, de que Ele venha ao nosso encontro para nos tornar partícipes da Sua vida. Simeão encarna a imagem da humanidade que tende a acolher o raio de luz, que faz novas todas as coisas, o germe de vida que transforma cada velhice em perene juventude.

Neste contexto, adquire um significado singular o Dia da Vida consagrada, que hoje celebramos pela primeira vez. Já há tempo a Festa da apresentação de Jesus no Templo reunia nas Comunidades diocesanas os membros dos Institutos de Vida consagrada e das Sociedades de Vida apostólica, para manifestarem diante do povo de Deus a alegria do empenho, sem reservas, pelo Senhor e pelo seu Reino. Eu quis que esta experiência se estendesse à Igreja inteira, para dar graças a Deus pelo grande dom da vida consagrada e promover, cada vez mais, o seu conhecimento e a sua estima. E de estímulo serviu também o Sínodo dos Bispos sobre a Vida consagrada, celebrado recentemente, cujos resultados confluíram na Exortação Apostólica pós-sinodal «Vita consecrata».

Enquanto vos convido a rezar, caríssimos, por estes nossos irmãos e irmãs que oferecem o seu testemunho de Cristo pobre, casto e obediente, dirijo-me com o pensamento em particular a quantos corroboraram o seu serviço à Igreja com o sacrifício da vida.


Papa João Paulo II
Angelus, 02 de Fevereiro de 1997

FESTA DA APRESENTAÇÃO DO SENHOR - Impossível deixar de olhar-te, Senhor



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA


«Impossível deixar de olhar-te, Senhor»


“Não o permitas, Senhor Deus meu, não permitas, Amado meu, que meus olhos estejam em outro lugar distinto de minha cabeça, e que eu não esteja continuamente unido a Ti, meu Amado. Te seguirei com todas as minhas forças por onde quer que vás ou voltes, e quando não puder alcançar-te me contentarei com cair rendido a ti. Tenho muito gravada esta frase: pela vida do Senhor e por minha vida, que não te deixarei, e que terei meus olhos sempre em ti. Teu escravo está sempre disposto a obedecer o que ordene o meu Senhor, mas me resulta intolerável que afastes teus olhos de mim ou que eu os tire de ti. Volta teus olhos para mim e os meus para ti, porque eu jamais poderei olhar a ti se Tu não te fixas antes em mim. Tu, que és o mais formoso, sereno e doce de todos, o Unigênito de Deus Pai, que vives e reinas com esse mesmo Pai e o Espírito Santo e és Deus por todos os séculos dos séculos. Amém”.


John of Ford, Abade Cisterciense
Sermón 48 sobre el Cantar de los Cantares, vol. II, p. 226
Biblioteca Cisterciense – Burgos 2003

APRESENTAÇÃO DO SENHOR - O mistério da Apresentação do Senhor



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA

«O mistério da Apresentação do Senhor»

A Festa da Apresentação do Senhor, que a Igreja hoje celebra, é de muito rico significado. Eis alguns:

Hoje, o Messias, Filho de Davi, entra pela primeira vez na Cidade Santa, a Cidade de Davi, cidade messiânica por excelência: é o encontro do Messias com a sua Cidade. Neste sentido, esta Festa é como que uma antecipação do Domingo de Ramos. Nas antífonas do Ofício das Leituras, este aspecto é recordado: “Radiante de esplendor, põe-te de pé: despontou a tua luz, Jerusalém, e a glória do Senhor te iluminou!” ou ainda: “De alegria exulta, ó nova Sião! Eis que vem o teu Rei, humilde e bondoso, salvar o seu povo”. É importante recordar que Jerusalém é imagem da Igreja, a nova Sião, que acolhe o Messias, seu Rei, seu Senhor, seu Esposo: “Sião, enfeita o teu quarto nupcial e recebe o teu Rei, Cristo Jesus, que a Virgem concebeu e deu à luz, e, conservando a virgindade após o parto, adorou aquele mesmo a quem gerou!”

Se o Messias entra em Jerusalém pela primeira vez, essa visita concentra-se no Templo, também imagem da Igreja. E este é o aspecto mais presente na liturgia: “O Senhor vem a seu Templo: vinde, adoremos!”; “Recordamos, Senhor Deus, vossa bondade, em meio ao vosso Templo!” A primeira leitura da Missa, tirada do profeta Malaquias (3,1-4), recorda que o Messias deveria visitar aquele Templo de Jerusalém, suntuoso no tempo de Salomão e reconstruído tão modesto logo após o Exílio de Babilônia: vai entrar nele o Dominador, o Anjo da Aliança; por isso esse Templo é cheio de glória! Na entrada de Jesus no Templo, dois mistérios se cumprem: Deus realiza o que havia prometido pelos profetas: envias o Messias a Israel – e agora ele é apresentado oficialmente no Templo, centro da religião judaica; por outro lado, esse Templo é imagem da Igreja. Assim, o Esposo vem até a Esposa. Eis um dos motivos da procissão com velas no início da Missa: a Igreja, como virgem prudente, vigia para acolher seu Esposo com lâmpadas acesas: lâmpadas do amor, da fé, da esperança! E este que vem é “luz para iluminar as nações” – como dirá Simeão -, as nações chamadas, pelo Batismo a entrarem na Igreja Esposa de Cristo, Jerusalém nossa Mãe.

Hoje, o Menino, como primogênito, é apresentado a Deus, cumprindo a Lei de Moisés – “Todo macho que abre o útero materno será consagrado ao Senhor” (Ex 13,2). O Filho eterno, Autor da Lei, submete-se à Lei para nos libertar do julgo da Lei! É o mistério da humilhação e da obediência de Cristo, sempre presente no seu caminho, e que culminará na cruz, morte e sepultura.

Um outro aspecto tocante nesta Festa: Simeão e Ana representam o Antigo Testamento: idosos eles esperam a promessa do Senhor; eles vivem da Esperança de Israel. Pois bem, não foram desiludidos na sua certeza. Podemos imaginar o velho Simeão tomando o Menino; podemos quase ver seu rosto iluminando-se; podemos vislumbrar sua emoção e gratidão a Deus: “Podes deixar, Senhor, o teu servo partir em paz! Meus olhos viram a tua Salvação!” É quase como se o Antigo Testamento dissesse: “Pronto! Cumpri minha missão; tudo quanto trazia em mim de promessa agora se realiza!”

O Menino-Messias que Simeão toma nos braços é glória de Israel, é o cumprimento das promessas feitas aos Pais. Mas é também luz para todas as nações da terra: ele vem para a humanidade toda, ele vem abrir o Antigo Israel para o mistério do Novo Israel, que é a Igreja, Novo Povo de Deus – este é o outro motivo das velas na procissão que antecede a Missa de hoje: o Menino é Luz; a Virgem traz nos braços a Luz do mundo! No entanto, isto não acontecerá sem dor, sem a cruz. Por isso o mistério da contradição e a espada que traspassará o coração da Mãe! Não há salvação sem participação na cruz, não há remissão dos pecados sem efusão de sangue, como diz a Epístola aos Hebreus!

Um outro aspecto é a Virgem Maria. Com José, ela traz tudo quanto possui, seu Tesouro, o Filho primogênito, para consagrá-lo ao Senhor. E Simeão avisa: o Senhor aceitou a oferta. Este Menino hoje apresentado a Deus no Monte Moriá – o Monte do Templo – será imolado no Monte Calvário. Como não recordar aqui o dramático sacrifício de Abraão: ali mesmo, no Monte Moriá, o Senhor Deus poupou o filho de Abraão! É que no seu lugar, Deus estava preparando o seu Filho, filho de Maria, para ser sacrificado no lugar da descendência de Abraão! “Deus providenciará a vítima para o sacrifício!” – Hoje cumpriu-se essa palavra... E o Deus que poupou o filho de Abraão, não poupou o seu Filho, não poupou o filho de Maria! E quando chegar a hora do Monte Calvário, ela estará ali, com uma fé maior que a de Abraão, de pé, como Virgem Fiel, como Torre de Davi!

Estes são alguns dos aspectos desta Festa. Haveria outros ainda... Admiremos e adoremos a sabedoria do Senhor, que com admirável economia (economia, em teologia, é a ação de Deus na história da salvação), conduz a humanidade à graça da salvação!


Dom Henrique Soares da Costa
Bispo Titular de Acúfica e Auxiliar de Aracaju
Site D.Henrique

FESTA DA APRESENTAÇÃO DO SENHOR - Pela humildade ao coração do Amor



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA


«Pela humildade ao coração do Amor»


“Como este ser inefável não pode ser visto senão de uma maneira inefável, o que queira vê-lo purifique seu coração. Porque o que dorme não pode alcançá-lo através de nenhuma semelhança corporal, nem o que vela, por nenhuma forma sensível; nenhuma busca da razão pode vê-lo nem alcançá-lo mas somente um coração puro que ama humildemente.

Este é o Rosto de Deus que ninguém pode ver e, ao mesmo tempo, viver para o mundo. Esta é a beleza que aspira a contemplar todo aquele que deseja amar ao Senhor, seu Deus, com todo o seu coração, com toda a sua alma, com toda a sua mente e com todas as suas forças. E tão pouco deixa de incitar seu próximo a isso se o ama como a si mesmo”.



Guilherme de Saint-Thierry
Abade do Mosteiro de Saint-Thierry
Carta de Oro, Azul 2003, p.159

APRESENTAÇÃO DO SENHOR - Dai-me, Senhor, uma fé que habilite meu espírito para falar com Deus e com os homens



APRESENTAÇÃO DO SENHOR
02 DE FEVEREIRO
FESTA

«Dai-me, Senhor, uma fé jubilosa que encha de paz e alegre meu espírito, e o habilite para falar com Deus e com os homens, de modo que irradie no colóquio sagrado e profano a interior beatitude de sua afortunada posse»


“Senhor, eu creio; quero crer em Vós. Ó Senhor, fazei que minha fé seja plena, sem reservas, penetre meu pensamento, meu modo de julgar as coisas divinas e as humanas.

Ó Senhor, fazei com que a minha fé seja livre; isto é, tenha o concurso pessoal da minha adesão, aceite as renúncias e os deveres que exige; exprima ela o ápice decisivo da minha personalidade: creio em Vós, Senhor.

Ó Senhor, dai-me uma fé certa; com provas exteriores convenientes e com interior testemunho do Espírito Santo, certa por sua luz tranqüilizante, por sua conclusão pacificante, por sua assimilação serena.

O Senhor, fazei forte minha fé, sem temor das contrariedades, dos problemas que enchem a experiência de nossa vida ávida de luz; não tema os ataques de quem a discute, a impugna, a refuta, a nega; mas se torne cada vez mais firme pelo testemunho interior de vossa verdade.

Dai-me, Senhor, uma fé jubilosa que encha de paz e alegre meu espírito, e o habilite para falar com Deus e com os homens, de modo que irradie no colóquio sagrado e profano a interior beatitude de sua afortunada posse.

Ó Senhor, fazei ativa a minha fé, que dê à caridade as razões de sua expansão moral, para ser verdadeira amizade convosco e seja contínua busca de Vós nas obras, nos sofrimentos, na espera, na revelação final; seja um contínuo testemunho e alimento contínuo da esperança.

Ó Senhor, fazei com que minha fé seja humilde e não presuma fundamentar-se na experiência de meu pensamento e de meu sentimento, mas se renda ao testemunho do Espírito Santo; e outra melhor garantia não tenha que a docilidade à autoridade do Magistério da Santa Igreja. Amém”.


Papa Paulo VI
Ensinamentos V6, pp.994-995
Insegnamenti, 9vols, Poliglota Vaticana, 1963-71

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Transfiguração do Senhor - Esse Sol te fascinará com seu divino esplendor



FESTA DA TRANSFIGURAÇÃO DO SENHOR

Evangelho do dia: Mt 17, 1-9

Esse sol te fascinará com seu divino esplendor

“«Seu rosto brilhou como o sol» (Mt 17, 2). Por que admirar que o rosto de Jesus se tivesse tornado como o sol, se Ele era o próprio Sol? Era o Sol, mas dissimulado pela nuvem. Agora, a nuvem se afasta e Ele resplandece por um instante. Que nuvem é essa que se afasta? Não é a carne, mas a fraqueza da carne que, por um momento, desaparece. É a nuvem de que fala o Profeta: «Eis que vem o Senhor numa nuvem leve» (cf. Is 19, 1); leve, porque não carrega pecado algum; nuvem, porque dissimula o esplendor divino; leve, porque é assumida no esplendor eterno; nuvem, da qual diz o Cântico: «À sombra de quem tanto desejara me sentei» (Ct 2, 3); leve, porque é a carne do Cordeiro que tira os pecados do mundo. Uma vez que eles foram tirados, o mundo é elevado às alturas do céu, aliviado do peso de todos os seus pecados. O Sol velado por essa carne não é aquele que se levanta para os bons e os maus, mas «o Sol de justiça» (Ml 4, 2), que só se levanta para os que temem a Deus. Revestida dessa nuvem de carne, hoje, a Luz que ilumina todo homem resplandeceu. Hoje, ela glorifica essa mesma carne, mostra-a deificada aos apóstolos, para que estes a revelem ao mundo.

E tu, cidade bem-aventurada, gozarás eternamente da contemplação desse Sol, quando desceres do céu, adornada para Deus como a esposa para seu esposo; nunca mais em ti esse Sol se há de pôr: eternamente o mesmo, Ele fará brilhar uma eterna manhã. Esse Sol jamais será coberto por qualquer nuvem, e sua irradiação incessante te rejubilará com uma luz sem declínio. Esse Sol já não deslumbrará teus olhos, mas te dará a força de fixá-lo e te fascinará com seu divino esplendor. Esse Sol não conhecerá nenhum eclipse, e seu brilho não será empanado por nenhum sofrimento, pois a «morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem grito, nem dor» (Ap 21, 4) que possam diminuir o brilho que Deus te concedeu. Com efeito, João ouviu estas palavras vindas do céu: «As coisas anteriores passaram» (Ap 21, 4).

Eis o Sol de que fala o Profeta: «Não será mais o sol a luz do teu dia, nem será a lua que vai te iluminar à noite; o próprio Senhor será para ti luz permanente, e o teu brilho será o teu Deus» (Is 60, 19). Eis aquela luz eterna que resplandece em ti, na face do Senhor.

Ouves a voz do Senhor, contemplas a sua face resplandecente, e te tornas como o sol. Pois é pela face que se reconhece alguém e, reconhecê-lo, é ser por ele iluminado. Aqui tu crês, lá reconhecerás. Aqui compreendes pela inteligência, lá serás compreendido. Aqui vês como num espelho, lá verás face a face. Irradiado para sempre pelo brilho desse Sol eterno, tu o reconhecerás tal como ele é, e a alegria te iluminará. A face do Senhor resplandecerá sobre ti com tanto fulgor, que cumulará aquela aspiração do Profeta: «Que sua face resplandeça sobre nós!» (Sl 66 [67], 2)”.

São Pedro Venerável, Abade
Sermo 1, De Transfiguratione Domini
Patrologia Latina 189

Transfiguração: Jesus não é uma abstração; está ressuscitado e vivo



FESTA DA TRANSFIGURAÇÃO DO SENHOR

Transfigurou-se diante deles


Por que a fé e as práticas religiosas estão em declive e não parecem constituir, ao menos para a maioria, o ponto de força na vida? Por que o tédio, o cansaço, o incômodo ao cumprir os próprios deveres de crentes? Por que os jovens não se sentem atraídos? Por que, em resumo, esta monotonia e esta falta de alegria entre os crentes em Cristo? O maravilhoso episódio da transfiguração nos ajuda a dar uma resposta a estes interrogantes.

O que a transfiguração significou para os três discípulos que a presenciaram? Até então haviam conhecido Jesus em sua aparência externa, um homem não diferentes dos demais, de quem conheciam sua procedência, seus costumes, seu tom de voz... Agora conhecem outro Jesus, o verdadeiro Jesus, o que não se consegue ver com os olhos de todos os dias, à luz normal do sol, mas que é fruto de uma revelação imprevista, de uma mudança, de um dom.

Para que as coisas mudem também para nós, como para aqueles três discípulos no Tabor, é necessário que aconteça em nossa vida algo semelhante ao que ocorre a um rapaz ou a uma moça quando se apaixonam. No namoro o outro, o amado, que antes era um entre muitos, ou talvez um desconhecido, de repente se converte em único, o único que interessa no mundo. Todo o resto retrocede e se situa em um fundo neutro. Não se é capaz de pensar em outra coisa. Acontece uma autêntica transfiguração. A pessoa amada se contempla como em um raio luminoso. Tudo parece belo nela, até os defeitos. A pessoa pode até se sentir indigna diante do amado. O amor verdadeiro gera humildade. Algo muda também concretamente até nos hábitos de vida. Conheci jovens a quem de manhã seus pais não conseguiam tirar da cama para ir ao colégio; se encontravam um trabalho, em pouco tempo o abandonavam; ou descuidavam dos estudos sem chegar a formar-se nunca... Depois, quando se enamoraram de alguém e começam a namorar, de manhã pulam da cama, estão impacientes por finalizar os estudos, se têm um trabalho, cuidam muito dele. O que ocorreu? Nada, simplesmente o que antes faziam por constrição agora o fazem por atração. E a atração é capaz de fazer coisas que nenhuma constrição consegue; ela coloca asas nos pés. «Cada um, dizia o poeta Ovídio, é atraído pelo objeto do próprio prazer.»

Algo assim, dizia eu, deveria acontecer uma vez na vida para sermos verdadeiros cristãos, convencidos, alegres por sê-lo. «Mas a menina e o menino podemos ver, tocar!» Respondo: também a Jesus se vê e se toca, mas com outros olhos e com outras mãos: do coração, da fé. Ele está ressuscitado e está vivo. É um ser concreto, não uma abstração, para quem teve esta experiência e este conhecimento. Mais ainda, com Jesus as coisas são inclusive melhores. No namoro humano há artifício, atribuindo ao amado qualidades das quais talvez carece e com o tempo freqüentemente se está obrigado a mudar de opinião. No caso de Jesus, quanto mais se conhece e se está do seu lado, mais se descobre novos motivos para estar enamorado d’Ele e seguros da própria escolha.

Isso não quer dizer que se deva estar tranqüilos e esperar, também com Cristo, a clássica «flechada». Se um rapaz, ou uma moça, passa todo o tempo fechado em casa sem ver ninguém, jamais acontecerá nada em sua vida. Para namorar deve estar em contato! Se não está convencido, ou simplesmente começa a pensar que talvez conhecer Jesus deste modo diferente, transfigurado, é belo e vale a pena, então é necessário que comece a entrar em contato, a ler seus escritos. Suas cartas de amor estão no Evangelho! É aí onde Ele se revela, onde se «transfigura». Sua casa é a Igreja: é aí onde podemos encontrá-lo.

Pe. Raniero Cantalamessa
Pregador da Casa Pontifícia
Comentário em 15 de fevereiro de 2008
Cit. por Cantalamessa.org

SANTO CURA D’ARS - A oração é uma união com Deus



FESTA 04 DE AGOSTO

«Até agora, ainda não pedistes nada. Pedi e recebereis; assim sereis cumulados de alegria».

“Vede, meus filhos: o tesouro do cristão não está na terra, mas no Céu. (Mt. 6, 20). Pois bem! O nosso pensamento deve estar onde está o nosso tesouro. O homem tem a bela função de rezar e amar. Vós rezais, e amais: eis a felicidade do homem sobre a terra.

A oração, outra coisa não é senão uma união com Deus. Quando se tem o coração puro e unido a Deus, sente-se um bálsamo, uma doçura que inebria, uma luz que encandeia, atrai, seduz. Nesta íntima união, Deus e a alma são como dois pedaços de cera fundidos entre si; jamais se podem separar. É uma coisa muito bela esta união de Deus com a sua pequena criatura. É uma felicidade que não se pode compreender. Nós não éramos dignos de rezar, mas Deus, na Sua bondade, permitiu que lhe falássemos. A nossa oração é um incenso que Deus recebe com um extremo, imenso prazer.

Meus filhos, vós tendes um coração pequeno, mas a oração dilata-o e torna-o capaz de amar a Deus. A oração é um ante gozo do Céu, um fluxo do paraíso. Ela nunca nos deixa sem doçura. É um mel que desliza pela alma e tudo dulcifica. Os sofrimentos, as dores derretem-se diante duma oração bem feita, como a neve diante do sol”.

S. João Maria Vianney
Catecismo sobre a oração

S. JOÃO MARIA VIANNEY - A mensagem que o Cura d’Ars nos dirige hoje



FESTA 04 DE AGOSTO

Homem de oração

Longos momentos diante do tabernáculo, uma verdadeira intimidade com Deus, um abandono total a sua vontade, um rosto transfigurado; características que impressionavam quem o encontrava e permitiam perceber a profundidade de sua vida de oração e de sua união com Deus. Para não falar de sua grande alegria e de sua verdadeira amizade com Deus: «Eu vos amo, ó meu Deus, e meu único desejo é amar-vos até o último suspiro de minha vida». Uma amizade que implica uma reciprocidade, como dois pedaços de cera, que, uma vez fundidos, explicava João Maria Vianney, já não podem ser separados nem identificados; o mesmo acontece entre nossa alma e Deus, quando rezamos.

O coração pulsante: a Eucaristia celebrada e adorada

«Ele está ali!», exclamava o Santo Cura, apontando para o tabernáculo. Homem da Eucaristia, celebrada e adorada: «Não há nada maior que a Eucaristia», exclamava. Talvez o que mais o tenha impressionado foi constatar que seu Deus estava ali, presente para nós no tabernáculo. «Ele nos espera!» A tomada de consciência da presença real de Deus no Santíssimo Sacramento talvez tenha sido uma de suas maiores graças e uma de suas maiores alegrias. Dar Deus aos homens e os homens a Deus: o sacrifício eucarístico tornou-se, muito cedo, o cerne de seus dias e de sua pastoral.

Obcecado pela salvação dos homens

Talvez seja essa expressão a que melhor resume o que foi o Santo Cura ao longo de seus 41 anos de presença em Ars. Obcecado por sua salvação e pela salvação dos outros, especialmente daqueles que o procuravam ou tinham sido postos sob sua responsabilidade. Como pároco, Deus há de lhe «pedir contas» deles, dizia. Para que todos pudessem sentir a alegria de conhecer a Deus e de amá-lo, de saber que Ele nos ama: era assim que agia sem descanso João Maria Vianney.

Mártir do confessionário

De 1830 em diante, milhares de pessoas irão a Ars para se confessar com ele; serão mais de 100 mil no último ano de sua vida. Pregado em seu confessionário até 17 horas por dia, para reconciliar os homens com Deus e entre si, o Cura d’Ars é «um verdadeiro mártir do confessionário», frisava João Paulo II. Conquistado pelo amor de Deus, admirado diante da vocação do homem, o Cura d’Ars media a loucura que havia em que alguém quisesse se separar de Deus. Queria que todos fossem livres para poder saborear o amor de Deus.

No coração de sua paróquia, um homem de autêntica sociabilidade

«Não sabemos o que o Santo Cura não fez em termos de obras sociais», relata um de seus biógrafos. Vendo a presença do Senhor em cada um de seus irmãos, ele não se dava um minuto de paz procurando socorrê-los, aliviar seus sofrimentos ou suas feridas, criar condições para que cada um se sentisse livre e realizado. Orfanato, escolas, dedicação aos mais pobres e aos doentes, construtor incansável... nada lhe escapava. Acompanhava as famílias e se esforçava por protegê-las de tudo o que pudesse destruí-las (o álcool, a violência, o egoísmo...). Em seu vilarejo, procurava considerar o homem em todas as suas dimensões (humana, espiritual, social).

Padroeiro de todos os párocos do universo

Beatificado em 1904, será declarado por São Pio X, em 12 de abril do mesmo ano, padroeiro dos sacerdotes da França. Em 1929, quatro anos depois de sua canonização, papa Pio XI o declarará «padroeiro de todos os párocos do universo». Papa João Paulo II sublinhará essa idéia, recordando em três ocasiões que «o Cura d’Ars continua a ser para todas as cidades um modelo sem par, ao mesmo tempo de realização do ministério e de santidade do ministro». «Oh, o sacerdote é algo realmente grande, pois pode dar Deus aos homens e os homens a Deus; é testemunha da ternura do Pai por cada um e artífice da salvação!», exclamava João Maria Vianney. O Cura d’Ars é um grande irmão no sacerdócio, a quem todo sacerdote do mundo pode confiar seu ministério ou sua vida sacerdotal.

Um chamado universal à santidade

«Eu lhe mostrarei o caminho do Céu», respondera ao pastorzinho que lhe indicava o caminho para Ars, ou seja, vou ajudá-lo a tornar-se santo. «Por onde passam os santos, passa Deus com eles!», afirmaria mais tarde. No fim de seus dias, convidava cada pessoa a se deixar santificar por Deus, a buscar com todos os meios essa união com Deus, neste mundo e por toda a eternidade.

Cit.por Ars Net. Org