domingo, 13 de dezembro de 2009

ADVENTO – 3º DOMINGO – O amor que deseja a face do Amado



DOMINGO III DO ADVENTO

«O amor que deseja a face do Amado»

Vendo o mundo oprimido pelo temor, Deus procura continuamente chamá-lo com amor, convidá-lo com a sua graça, segurá-lo com a caridade, abraçá-lo com afeto. Por isso, purifica com o castigo do dilúvio a terra que se tinha inveterado no mal; chama Noé para gerar um mundo novo; encoraja-o com palavras afetuosas, concede-lhe sua confiante amizade, o instrui com bondade acerca do presente e anima-o com sua graça a respeito do futuro. E já não se limita a dar-lhe ordens, mas tomando parte no seu trabalho, encerra na arca toda aquela descendência que havia de perdurar por todos os tempos, para que esta aliança de amor acabasse com o temor da servidão esse conservasse na comunhão de amor o que fora salvo com a comunhão de esforços.

Por esse motivo chama Abraão dentre os pagãos, engrandece seu nome, torna-o pai dos crentes, acompanha-o em sua viagem, protege-o entre os estrangeiros, cumula-o de bens, exalta-o com vitórias, dá-lhe a garantia de suas promessas, livra-o das injúrias, torna-se seu hóspede, maravilha-o com o nascimento de um filho que ele já não podia esperar. Tudo isso a fim de que, cumulado de tantos benefícios, atraído pela grande doçura da caridade divina, aprendesse a amar a Deus e não mais temê-lo, a honrá-lo com amor e não com medo.

Por isso também consola em sonhos a Jacó quando fugia, desafia-o para um combate em seu regresso e na luta aperta-o nos braços, para que não temesse, porém, amasse o instigador do combate. Por isso ainda, chama Moisés na própria língua e fala-lhe com afeto paterno, convidando-o a ser o libertador de seu povo.

Em todos esses fatos que relembramos, de tal modo a chama da caridade divina inflamou o coração dos homens e o inebriamento do amor de Deus penetrou os seus sentidos que, cheios de afeto, começaram a desejar ver a Deus com os olhos do corpo. Deus, que o mundo não pode conter, como o olhar limitado do homem o abrangeria? Mas, o que deve ser, o que é possível, não é a regra do amor. O amor ignora as leis, não tem regra, desconhece medida. O amor não desiste perante o impossível, não desanima diante das dificuldades. O amor, se não alcança o que deseja, chega a matar o que ama; vai para onde é atraído, e não para onde deveria ir. O amor gera o desejo, cresce com ardor e pretende o impossível. E que mais? O amor não poderia deixar de ver o que ama. Por isso todos os santos consideravam pouca coisa toda recompensa , enquanto não vissem a Deus. Por isso mesmo, o amor que deseja ver a Deus, vê-se impelido, para além de todo raciocínio, pelo fervor da piedade. Por isso Moisés se atreve a dizer: “Se encontrei graça na vossa presença, mostrai-me o vosso rosto” (Ex 33,13.18). Por isso, diz também o Salmista: “Não me escondais a vossa face” (Sl 26,9). Por isso, enfim, até os próprios pagãos, no meio de seus erros, modelaram ídolos, para poderem ver com seus próprios olhos o objeto de seu culto.


São Pedro Crisólogo, Bispo de Ravena
Sermo 147: PL, 52, 594-595


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